quinta-feira, 22 de março de 2012

Chefe... ”Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é”

Equipe Unesc • 2006






















 “Um diamante mesmo enterrado no lodo, continua um diamante.” 

Outro dia li esta frase em um livro e ela ficou guardada em minha mente, pois transmite na sua simplicidade uma mensagem muito importante, porque em muitas circunstâncias da vida, deixamos de acreditar no que verdadeiramente somos.

Relembrando fases diferentes da minha vida profissional, fazendo um “mini-flashback” como dizia aquela atriz, pude perceber o quanto progredi nesses últimos anos e o quanto aprendi no dia a dia, mesmo vivendo numa cidade pequena e onde aparentemente não iria encontrar muitos desafios. Ledo engano...

Meu primeiro emprego foi numa galeria de arte, eu era uma aprendiz de “marchand” tinha só 17 anos, foi um experiência e tanto. A artista muito excêntrica pintava quadros maravilhosos e eu tive neste emprego minha primeira grande lição: como é bom ter um lar, para onde se possa voltar após um dia muito duro de trabalho. Lembro de um dia que cheguei tão estafada em casa de tarde que deitei no sofá e lá adormeci profundamente, um sono tão pesado que não senti meu pai carregar meus 1,75m e quase 70 kg nos braços e quando acordei no outro dia de manhã estava na minha cama, debaixo das cobertas de tênis e carteira no bolso... Acho que foi a última vez que meu pai me carregou no colo, rs Depois deste vieram alguns outros empregos, vou relatar aqui os que mais me marcaram.

Primeiro num departamento de criação em um laboratório que tive oportunidade de ter um chefe maravilhoso, o Sidney que percebeu talento gráfico em mim e me incentivou a ir estudar Artes Gráficas no Senai Theobaldo de Nigris e lá na melhor escola de Artes Gráficas do Brasil, pude adquirir conhecimentos importantes que apliquei também no meu curso de biblioteconomia. Hoje eu cuido de livros, lá aprendi a produzir livros. Muito obrigada Sidney, onde quer que você esteja.

Depois de formada passei por alguns bureaus de pré-impressão onde fui diagramadora e posteriormente consegui uma colocação numa editora de revistas. Lá fiz bons amigos, Sueli ilustradora talentosíssima e meu querido Emmanuel dono da editora, uma pessoa boníssima e extremamente divertida. Eu achava incrível o fato dele ser nosso chefe e simplesmente não parecer um chefe e ao mesmo tempo era respeitado, querido e amigo de todos.  Neste emprego aprendi que você pode ser chefe e ser leve e divertido ao mesmo tempo em que trabalha.

Depois desta editora passei por um progresso acentuado quando consegui um trabalho em um estúdio de arte muito promissor em São Paulo. Este estúdio estava crescendo e trabalhava com grandes clientes, multinacionais e só usava plataforma Macintosh. Foi o período onde tive mais contato com o Designer gráfico e pude após este tempo, trabalhar alguns anos como autônoma, em meu próprio estúdio. 

Foi só um ano, mas acho que foi o lugar onde tive, antes de sair de São Paulo, meu maior aprendizado para a vida profissional. Pra começar esta história, lembro o dia da entrevista, eu sentada em frente ao computador com uma página para criar e minha entrevistadora ao meu lado me explicando o que queria. Quando ia começar, uma porta se abriu e uma criança de uns três anos veio em nossa direção e sentou-se no meu pé e eu tentava prestar atenção na minha entrevista.

Quando comecei a diagramar vi o menino enroscado no meio dos fios e virei para a moça e falei: “ele vai se machucar!”. Ela me olhou e respondeu assim: “cuida da sua entrevista que do meu filho cuido eu!”.

Eu, não sabia onde enfiava a cara de tanta vergonha e só pensei: nossa, como pode ser tão grosseira... Fiz meu teste, fui bem, mas sinceramente não achei nem um pouco interessante ir trabalhar lá depois do fato ocorrido já na entrevista.

Voltei para casa e continuei minha busca até que um mês após o teste me chamaram deste mesmo estúdio para trabalhar, se ainda estivesse disponível. Como já estava há quase dois meses procurando emprego e a oportunidade no estúdio muito boa em termos de experiência profissional e salário, esqueci o ocorrido e fui trabalhar.

Neste estúdio conheci boas pessoas e tenho uma linda amiga com a qual até hoje me correspondo e que amo de todo meu coração. Mas após um ano de trabalho nesta empresa o que mais pude interiorizar e aprender, para toda minha vida, é o que eu NÃO deveria ser quando fosse responsável pelo trabalho de alguém.

Eu pela convivência com vários profissionais de muita capacidade e talento, aprendia elementos importantes para a profissão de designer, ao mesmo tempo infelizmente, tive uma colega de trabalho que me deixou em situações tão constrangedoras que hoje rememorando, não sei como eu consegui sobreviver e tirar ainda assim, algo de bom deste período da minha vida profissional.

Para ter uma ideia um dia, ela me apresentou a uma importante executiva de uma multinacional, cliente do estúdio, usando a frase: “esta é a Sandra, a macumbeira da equipe”, só porque ela sabia que minha família era Kardecista.

Na festa de confraternização no final do ano ela na mesa com todos os funcionários reunidos me gritou lá do canto onde estava dizendo assim para mim: “Sandra, come esse carpaccio que o garçom está servindo, pois lá da zona leste de onde você vem, não tem essas coisas!”.

Uma ocasião (isso até seria cômico, se não fosse trágico) ela virou para mim e disse assim: "sabe qual é o seu problema Sandra, seu problema é que você é feliz demais!".

Meu Deus... Ela me falava tantas barbaridades, mas eu só focava no fato de ter acabado de entrar na faculdade de biblioteconomia que era particular e, em outras várias responsabilidades e o salário deste emprego era excelente, eu pensava no dinheiro, me acalmava e prosseguia. Foi um ano de muita resignação e exercício de paciência...

Um dia ela me pegou para me passar um sermão na sala dela, ficou três horas seguidas falando sem parar, tantas barbaridades que eu chorava igual uma criança e em um determinado momento ela falou assim: “não esquenta não, eu entendo que você ainda não tem maturidade e por isso é normal você chorar assim na frente da sua chefe!"

Nesta empresa passei por tantas situações tristes e desagradáveis que voltando no tempo e rememorando os fatos para poder relatar "algumas coisinhas" aqui, chega a apertar o coração de tanta dor. A verdade é que eu deveria tê-la processado por perdas e danos morais. Mas naquela época eu ainda era muito inexperiente, tinha pouco mais de vinte anos e não era amplamente divulgado o que atualmente chamam de "assédio moral".

Nos últimos meses quando o despertador tocava de manhã, eu abria os olhos e pensava que tinha de ir para lá, meu estômago até revirava e meu coração apertava no peito, mas eu levantava...

E por ai vai... Foram tantas, mas tantas tristezas que passei neste lugar que quando completei um ano e já sonhava com as férias queria descansar minha cabeça, mas aconteceu de ter de ir trabalhar num sábado, para compensar uma falta, mesmo sem trabalhos atrasados, mas por convocação da “minha chefe” fui. 

Logo que cheguei ela veio passar os trabalhos que queria que eu fizesse e foi embora, depois de umas duas horas voltou e começou a me destratar sem motivação aparente, colocava defeito em tudo que eu havia feito, mas fazia isso de uma maneira muito mais estranha do que já era habitual, parecia que ela estava procurando confusão e eu mesmo assim, mantive como sempre a paciência. Neste um ano, nunca, nunca a enfrentei de forma alguma.

Só que ela permaneceu me atacando e em um dado momento, não resisti mais e empurrando a cadeira num chute só  me aproximei bem dela que era baixinha e perguntei: “minha filha, o que você tem afinal contra mim?”

Acho que todos os sapos de um ano lá que engoli vivos e viviam rolando em minha barriga resolveram sair todos ao mesmo tempo e eu cuspi todas as respostas que eu queria ter dado a ela no ano todo em que ela me torturou. Falei tudo que eu pensava e achava dela, falei meia hora sem parar, devolvi todo o lixo que ela tinha jogado em mim e disse que ela era uma “monstra” (risos).

Bom, depois disso nem preciso dizer que fui sumariamente demitida...

Eu voltei triste para casa, chorei o caminho todo e o fim de semana também pensando em como eu ia ficar sem meu emprego e como eu ia continuar minha amada faculdade se não conseguisse logo outro trabalho.

Mas na segunda-feira, quando o relógio não despertou, mas eu sozinha abri os olhos e lembrei que não ia precisar ir trabalhar lá, dava cambalhotas e gargalhadas deitada na minha cama e esta acho que foi a segunda-feira mais feliz da minha vida (risos).

Quando saí deste pesadelo prometi para mim mesma que, se algum dia eu chegasse a ser chefe de algum setor, ou empresa, nunca seria como esta minha ex-chefe.  Lá aprendi tudo que eu NUNCA deveria ser com meus colegas de trabalho.

Uma semana depois eu já tinha conseguido outro emprego muito legal, de meio período. Fiz outro vestibular, passei. Estudava Biblioteconomia de manhã, trabalhava à tarde no novo estúdio e cursava faculdade de Educação Artística à noite.

Minha situação melhorou e muito ao invés de piorar como eu pensei inicialmente... Ao invés de fazer uma eu estava fazendo duas faculdades. Como diz aquela música: "muitos temores nascem do cansaço e da solidão". Espero nunca mais ter de lembrar ou pensar sobre esta experiência...

Muito tempo se passou... 

Me formei, tive pequenas experiências em Bibliotecas em São Paulo e meu primeiro grande emprego como Bibliotecária formada foi no Unesc de Colatina. 

Posso dizer sem sombra de dúvidas que lá foi a experiência de trabalho mais feliz que tive na minha vida. A equipe de trabalho da biblioteca universitária era composta por dez pessoas para eu coordenar e eram todos rapazes. Eu trabalhava com dois assistentes, um menor aprendiz, dois estagiários e cinco auxiliares. A biblioteca era enorme, com diversos ambientes e mais de 50 mil livros no acervo e a rotina diária de atendimento era de cerca de 1.000 universitários nos três turnos.

Tive muita sorte, pois as pessoas com que trabalhei foram muito generosas e prestativas e eu retribuí a acolhida, procurei ao longo deste ano mais ensinar e mais aprender que “mandar”.

Eu não tinha subalternos, eu tinha colegas de trabalho, uma equipe de pessoas muito interessadas e com desejo de progredir. Muitos faziam serviços mecanicamente, pois não haviam explicado para eles os motivos de isso, ou aquilo, ser dessa forma na biblioteca eu passei a explicar os detalhes, procurei melhorar o acesso deles aos elementos que faziam parte de suas atividades e eles puderam entender o porque deles terem de realizar certos procedimentos. Os serviços passaram a ser assimilados, eram atividades compreendidas e não mais meramente mecânicas.

Com eles eu também aprendi muito, procurei dar oportunidade para todos falarem, sugerirem, aproveitei boas ideias dando crédito ao autor das mesmas, elogiava para meu superior minha equipe e pedia sempre que era possível, melhorias para as condições de trabalho deles.

Trabalhei muito, passei alguns apertos, dei muitas risadas, tive muito orgulho do que deixei lá, pois no dia que me despedi do meu diretor, ele me disse que nunca havia passado por lá uma Bibliotecária como eu, que tinha feito um excelente trabalho e que ele sentia por eu ter de deixá-los. Me senti muito orgulhosa do meu trabalho e feliz pela missão cumprida.

Tenho saudades até hoje dos meus amigos do Unesc, nunca devia ter saído de lá, mas essa...
É outra longaaaaa história para contar outro dia...

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